O conceito de doença mental (ou doença psíquica) abrange não apenas aspectos patológicos do individuo mas também aspectos de carácter social (desvio das normas). A doença mental é um conceito amplo (objectivo, subjectivo e social) que abrange as alterações da vivência e dos comportamentos do homem desde as alterações dos estados de animo às alterações do pensamento.
O diagnóstico de doença mental implica o uso de indicadores de carácter individual mas também colectivo. A doença mental pode ser definida como um estado de desequilíbrio susceptível de levar a pessoa a uma situação de desadaptação social, mas sobretudo à perda de liberdade interior.
A ideia da “loucura” (de perder a razão) é provavelmente o medo que mais tem perturbado o Homem. Por isso mesmo a “loucura” tem gerado nos homens (que se consideram sãos) ao longo dos tempos os mais variados sentimentos e atitudes, desde o horror à mais defensiva agressividade.
Do Alienado ao Enfermo
O Alienado (estranho ao sentir humano) tem sido vítima de uma série de práticas desumanas e só por si “alienantes”. Desde os autos de fé, às troças públicas. Desde as benzeduras às “psicoterapias” isotéricas e míticas. … Todas promovendo o isolamento e o estigma. A imagem que as pessoas têm da “loucura” está relacionada com as “Psicoses” (Esquizofrenia e Doença bipolar) .
As pessoas associam os doentes com: Dificuldades de comunicação, auto-negligência e comportamento violento.
Num estudo recente (Crisp et al, 2000) 71% dos inquiridos considerou que as pessoas com Esquizofrenia eram perigosas. Em outros estudos a Esquizofrenia aparece como a condição mais “geradora” de comportamento violento apenas depois das “toxicodependências”.
A doença mental tem sido muito estigmatizada pelas sociedades ditas “civilizadas”. O estigma tem origem na ignorância e em falsas crenças acerca da natureza e do “espectro” da doença mental.
A tolerância das sociedades à doença mental varia com a cultura. A resposta das Sociedades foi muitas vezes a criação de instituições asilares fechadas e longe dos centros residenciais (em ilhas como na Grécia e Finlândia)
No Reino Unido o número de Instituições asilares passou de 9 em 1827 para 77 em 1900. A localização e a arquitectura de tais instituições contribuiu muito para o reforço do estigma e do isolamento das pessoas com doença mental. Num estudo de 1990 (Leff et al.) realizado no Reino Unido, 3⁄4 dos doentes de “evolução prolongada” não tinham qualquer contacto com os seus familiares. Por outro lado o isolamento a que a institucionalização remete leva a uma crescente dificuldade de integração social. Assim, a pessoa com doença mental vê-se “desadaptada” não apenas pela sua condição mas também pelo estigma e isolamento.
Os avanços das neurociências, particularmente da psicofarmacologia e a consciência da necessidade de reabilitação e de inclusão social na comunidade levaram a programas de desinstitucionalização reinserção comunitária.
Quando não foi possível a reintegração familiar tentou-se a colocação das pessoas com doença mental de “evolução prolongada” em residências na comunidade. Tais programas implicavam “oficinas protegidas” ou “emprego apoiado”. Tal transição não é fácil por vários motivos. Importa antes de mais um maior esclarecimento sobre a doença mental e a promoção de uma mudança de atitude social.
Qualquer política de saúde mental que tenha como objectivo prevenir o isolamento das pessoas com doença mental passa necessariamente por um estudo realista do contexto social. A promoção da família como recurso afectivo e a sensibilização e responsabilização da comunidade, são medidas fundamentais de um programa que se deve iniciar precocemente nas novas gerações.
Dr. António Sampaio